terça-feira, 11 de maio de 2010

Tim Burton e Johnny Depp

20 anos de parceria...

Marco Tomazzoni
Alice no País das Maravilhas, mais do que o primeiro megasucesso de Tim Burton e Johnny Depp – o filme arrecadou até agora cerca de US$ 800 milhões ao redor do mundo –, marca também a comemoração dos 20 anos de parceria da dupla. Já são sete longas-metragens de uma relação que parece ficar cada vez mais forte, de identificação profunda de dois seres estranhos na indústria cinematográfica. As excentridades de um se encaixam com as do outro e isso resultou num patamar de qualidade que, além da excelência artística, encontra surpreendente respaldo junto ao público: juntos, os filmes acumulam quase US$ 2 bilhões de bilheteria.

 Depp e Tim Burton: sete filmes no currículo e quase US$ 2 bilhões de bilheteria
A história começou no final da década de 1980, quando Depp, ao deixar uma fracassada carreira de rockstar, resolveu seguir o conselho de Nicolas Cage e tentar a sorte em Hollywood. A primeira janela para a fama veio através da série Anjos da Lei (21 Jump Street), no papel de um policial que trabalhava disfarçado de adolescente em um colégio. Depp detestava o programa - chegou a acusá-lo de fascista - e, no cinema, só conseguiu papéis secundários em Platoon e A Hora do Pesadelo. A grande virada aconteceu com Cry Baby, do polêmico cineasta John Waters, e, principalmente, com Edward Mãos de Tesoura, ambos de 1990.
A conexão foi imediata. Depp encontrou Burton em um hotel de Los Angeles já completamente apaixonado pelo personagem, uma espécie de Pinóquio criado por um recluso cientista (Vincent Price, em um dos seus últimos trabalhos) que, apesar da aparência humana - pele muito branca e cabelos desgrenhados, como o diretor - tinha um único defeito: lâminas afiadas no lugar de mãos. "Aquele papel não era uma estratégia de carreira. Era a liberdade. Liberdade para criar, experimentar, aprender e exorcisar algo em mim", lembrou Depp anos depois. De fato, essa fábula sombria foi um divisor de águas na carreira do ator e é até hoje o maior êxito crítico de Burton, que vinha do blockbuster Batman.
A próxima investida da dupla foi Ed Wood (1994), uma homenagem àquele que é considerado por muitos o pior diretor de todos os tempos. Burton vinha de uma briga feia com Warner por causa de Batman - O Retorno e Depp, um astro depois de Gilbert Grape - Aprendiz de Sonhador e Don Juan de Marco, queria fugir da imagem de galã. O mergulho no universo dos filmes B, em uma belíssima fotografia em preto-e-branco, provou que os dois não precisavam da fantasia para conseguir emocionar plateias. Ou melhor, eles pelo menos tentaram: na melhor tradição Ed Wood, o filme foi um fracasso comercial retumbante, mesmo com a imprensa aplaudindo o longa-metragem. Mais tarde, o trabalho ganharia dois prêmios Oscar, de melhor maquiagem e melhor ator coadjuvante (Martin Landau).

Burton, Vincent Price e Depp em 1990, no set de Edward Mãos de Tesoura
Baseado no conto de Washington Irving, A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça surgiu cinco anos depois e, à época, foi o maior sucesso da carreira de Johnny Depp (US$ 200 milhões). Estrelado também por Christina Ricci, o filme abusava de uma direção de arte assustadora e litros de sangue para mostrar um fantasma colecionador de cabeças tocando o terror num vilarejo do século 18. O clima lúgubre e por vezes onírico da produção cristalizou o estilo de Burton, já famoso por essas histórias bizarras e soturnas. Isso ficou ainda mais evidente em Noiva Cadáver, primeira animação stop-motion dirigida por Burton – que antes havia produzido O Estranho Mundo de Jack e James e o Pêssego Gigante -, dublada por Depp.
Também em 2005, estreou a nova versão de A Fantástica Fábrica de Chocolate, do livro de Roald Dahl, e aí as cores escuras deram lugar à explosão de cores do mundo de Willy Wonka. A atuação bizarra de Depp no papel principal - inspirada, dizem por aí, em Michael Jackson - fez com que o personagem antes interpretado por Gene Wilder ganhasse dimensões completamente novas, inclusive uma estranhíssima fobia social. Crianças e adultos abarrotaram as salas de cinema, e a partir disso não é difícil saber por que a Disney apostou alto ao colocar Alice nas mãos de Burton.
O diretor voltou à farra de sangue e terror com Sweeney Todd: O barbeiro demoníaco da Rua Fleet, de 2007, uma adaptação do musical de Stephen Sondheim. Depp encabeça um elenco que não tinha experiência na música, mas que encara sem pudores a tarefa de cantar. A trama, uma mistura de assassinatos, vingança, paixão e tortas feitas de carne humana, conquistou o público e, de quebra, rendeu a terceira indicação ao Oscar a Johnny Depp.
Burton insiste que a participação do amigo sempre depende do papel e que a surpresa é a melhor parte da parceria. "Você quer ter certeza que as coisas continuam no mesmo nível, ou até melhores. É sempre empolgante ver o que ele acrescenta. E é divertido trabalhar com Johnny porque é como se sempre vai haver algo diferente e novo." Para Depp, tudo é bem mais claro - a confiança no diretor é irrestrita e absoluta, tanto que ele nem sabia que ia interpretar o Chapeleiro Maluco em Alice: aceitou entrar no filme totalmente no escuro. "Por mim, poderia ter sido até Alice", ele afirma. "Confiança é a chave de tudo. Sei com certeza que Tim confia em mim, o que é uma benção maravilhosa, mas isso não quer dizer que eu não fique sempre paralisado pelo medo de decepcioná-lo."
Veja abaixo a entrevista que a Reuters fez com Burton sobre o trabalho na adaptação de Lewis


"Confiança é a chave de tudo", Depp fala da relação entre ator e diretor
Você pode explicar sua visão sobre Alice no País das Maravilhas?
Tim Burton: Estamos tentando fazer um filme. Apenas pego versões e... porque é como gostar de material em quadrinhos, embora eu não sei se verei em algum momento um filme que realmente gostei baseado neles, porque sempre parece ser uma série de acontecimentos estranhos. Todo mundo é louco e é um tipo de garotinha passiva vagueando de episódio em episódio. Então, mesmo que os livros e as histórias sejam icônicos, nunca senti que houve um filme que realmente se fez um filme, traduzido da história para um filme. Então essa é a tentativa.
O que você tirou do material de Lewis Caroll?
É baseado em todo o material de Lewis Caroll, incluindo o "Poema Jabberwocky". Outros filmes de Alice sempre eram apenas uma garota vagueando passivamente com um monte de personagens estranhos. Tentamos tramar uma história que tenha emoção e faça sentido.
Você assistiu aos outros filmes de Alice?
Vi muitas das diferentes versões de Alice pelos anos. Eu sei que houve um filme musical pornô que eu lembro de ter assistido nos anos 70. E muitas outras diferentes versões.
Você pensa sobre um público específico antes de fazer o filme?
Não exatamente (risos). Digo, porque acho que você não pode. Quando fiz O Estranho Mundo de Jack, as pessoas pensaram que ele era muito estranho para crianças, mas elas gostaram muito. Você sabe que adaptei material de Roald Dahl e ele é sempre estranho, mas as crianças gostam disso. Pais frequentemente esquecem que crianças gostam de coisas estranhas. Então você tenta fazer isso para todos, creio.
Que tipo de tecnologia você desenvolveu para Alice?
Bem, parece mais uma combinação de coisas. Usamos técnicas que foram usadas antes. Apenas as misturamos de forma um pouco diferente, então isso é o que torna um pouco diferente para mim: a combinação de atuação e animação.
O que Johnny Depp trouxe ao Chapeleiro Maluco?
Ele gosta de se enfeitar. Pensei nos personagens de Alice no País das Maravilhas, eles sempre são retratados como loucos sem significado, e acho que ele tentou trazer algo, uma qualidade humana à loucura. Ele tentou entender um pouco mais... Tentamos dar a cada personagem sua loucura particular. Ele é bom para explorar isso, acho que por ele ser louco. Não sei.

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